O porquê da vida quase ninguém sabe, se vive e se morre.

Será que voar é o mesmo?

Algum encantamento nos faz subir nas termais?

Alguma procura pela paz de espírito nas alturas?

Quem sabe?

As gigantes imensidões dos espaços aéreos são reservadas aos sinceros de coração.

Mirem todos aqueles que vocês acham indignos de voar e percebam quão pouco tempo voarão.

A pureza do azul não perdoa aqueles que a penetram sem ter algo de anjo.

Anjos voam espaços mitológicos além da nossa atmosfera gasosa, mas são governados pelo mesmo elemento Ar que nos mantém pairando, portanto, para serem anjos necessitam de candura, de leveza, coisa obrigatória para anjos e necessária para humanos desasados.

Não encontro respostas do por quê voo. Até hoje quando me impuz metas, fui lançado ao chão pela Grande Natureza. Ela sempre me quis vagabundo, um ser vagando livre pelas correntes de ar. Ela sopra isto ao meu ouvido e me faz esquecer… as perguntas que teimam em não calar.

Os operários do ar, aqueles que apenas cumprem tarefas no voo para si e para os outros, quando alcançam suas metas perdem a vontade de voar.

Quanta gente já perdeu as asas?

Sempre senti pena daquelas formigas que acabam se livrando das suas asas com um simples movimento de patas. Desde criança nunca compreendi tão impressionante renúncia. Subitamente, de criaturas aladas tornam-se formigas ou cupins e se metem terra a dentro. Agora assisto seres alados humanos livrando-se das suas asas e metendo-se nos cupinzeiros das suas pequenas vidas de nascer e morrer. Minha visão de menino já não consegue então diferenciar humano de formiga de cupim.

Quando o sol alonga suas sombras encobrindo os vales, quase sei a resposta. Quando meu coração transborda de alegria voando ao lado de um pássaro, compreendo mais um pouco. Quando quase estou no chão e me vejo girando para cima, para cima, magicamente rodopiando num redemoinho invisível chego perto daquilo que os Deuses gritam e não ouço: as respostas aos meus porquês, todas as respostas ao mesmo tempo num caleidoscópio de compreensão.

Tenho que me acostumar a isto, frequentar os céus e saber tão pouco da Língua de Ouro das coisas que falam por si mesmas. Lá naquelas paragens já ouvi cânticos, vozes e outros sons humanos e celestiais, já respondi para gente que chamou pelo meu nome, já chorei e já amei meus inimigos, já amei a humanidade, já odiei e já me considerei a mais baixa das criaturas. Tudo isto serão as respostas?

Planar não é o bastante, flutuar é preciso quando o assunto é contemplação. Quando isto acontece, perguntas são vazias, não há porquês, porque a vida é um eterno AGORA em seu livre movimento.

Então cuidemos para que nossas patas não arranquem nossas asas involuntariamente transformando-nos irremediavelmente formigas ou cupins, que fazem a suprema renúncia da flutuação para sempre.